Vila Verde: Caso de sucesso de adaptação a nova escola num novo país (via Correio do Minho)



O relatório da Rede Eurydice 2004, sobre a população imigrante estudantil em 30 países da Europa, apontava para a existência em Portugal de um total de 89.540 crianças, jovens e adultos imigrantes no sistema de ensino.

É esta a matéria para esta crónica: o testemunho da Alzira Dias servirá para conferir como quando todos (encarregados de educação, alunos, professores e funcionários) querem vitórias, elas aparecem. 

Cheguei à Escola Secundária de Vila Verde para o primeiro dia do segundo período de 11.º em 2009. Vinda do Zimbabwe, que fica no sul de África, e dum sistema escolar completamente oposto. A primeira impressão que tive foi um choque. A minha antiga escola era só de raparigas, usávamos fardas, as diretoras da escola eram freiras e a língua falada era o inglês. Ao entrar no ESVV com um monte de jovens por todo lado, a gritar e a correr parecia-me uma floresta selvagem. Passei os primeiros dias a falar muito pouco, só quando era necessário. 
Para facilitar a minha vida, tive aulas de Português Língua Não Materna e foi através destas aulas que comecei a entrar na vida escolar. Envolvi-me em várias atividades e projetos da biblioteca escolar. Passei tanto tempo na biblioteca que fui considerada parte de mobiliário!
Quando começou o clube de teatro da escola, o VerDemCena, coordenado pela professora Ana Cristina Oliveira, inscrevi-me. Foi uma fase muito interessante que me ajudou a soltar a língua e através da qual interagi com uma diversidade de pessoas (dentro e fora da escola) que não teria a possibilidade de conhecer sozinha. Vestir (na função de figurinista) e atuar começou a dar-me confiança. O papel que mais se destacou foi o do João Grande, o bobo de corte, cujo principal objetivo era entreter as pessoas e fazê-las rir, o que consegui fazer com o meu sotaque engraçado. 
O grupo de dança foi a oportunidade de libertar a energia, pelo menos, duas vezes por semana. Divertimo-nos tanto a dançar as danças que foram ensinadas nas aulas de Educação Física - dançar kuduro e aprender as danças que fomos apresentar nas competições. O grupo, coordenado pela professora Júlia Leite, era constituído por vários alunos, principalmente raparigas, do 9.º até aos 12.º anos. 
Um pesadelo do liceu foi a Matemática. Da primeira vez não consegui passar no 12.º ano por causa de Matemática, mas não fui a única do meu ano a repetir. 
No ano seguinte, dediquei-me mais ao clube de teatro VerdEmCena, ao projeto Eco-escolas e à Matemática. Para poder ultrapassar as dificuldades nesta disciplina, frequentei explicações e fiz exercícios até começar a sonhar com números. 
Neste preciso momento ando na IPVC a tirar o curso de Design de Ambientes que não tem nada a ver com o meu curso do 12º. Foi graças a algumas professoras da escola que sempre estiveram atentas; ajudaram-me e aconselharam-me a fazer mais, a estudar e a fazer uns exames que podiam ser usados como provas de ingresso para um curso que queria. A principal responsável foi a professora Margarida, coordenadora da biblioteca escolar, que me mostrou antecipadamente o melhor caminho a seguir para ingressar no ensino superior.
Conheci tantas pessoas na ESVV - alunos, funcionários, professores… Mesmo que em alguns casos não me lembre dos nomes, quando passo por eles na rua é apenas um “olá” ou simplesmente um sorriso que pode tornar mais feliz o dia deles e o meu. 
Na ESVV vivi um período grato da minha vida, pelo que aprendi e pelas amizades que conquistei. São muitas as memórias que marcarão o meu percurso da vida.”

A vontade de vencer destes jovens é imensa apesar das dificuldades de integração social e linguística num novo país. Precisamos criar uma educação interdisciplinar de forma a permitir-lhes “soltar a língua” para se formarem como novos aprendizes da ciência. As escolas continuam permanentemente a dar resposta a novos compromissos.

Fonte Correio do Minho por Luís Monteiro

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