Portugal: Investigadora Vilaverdense conclui que jornais transmitem visão redutora das mulheres (via Correio do Minho)



Uma investigação do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho (UMinho) conclui que a imprensa portuguesa transmite uma visão dicotómica das mulheres: ou são seres “especiais” que conseguem triunfar num mundo “dominado por homens” ou vítimas incapazes de fugir de uma situação de subalternidade. Esta homogeneização faz com que os cidadãos tenham uma percepção redutora do papel das mulheres na sociedade, alerta Carla Cerqueira, autora de uma tese de doutoramento dedicada à cobertura do Dia Internacional da Mulher em dois jornais, desde 1975 até 2007.

O estudo teve como objectivo analisar a evolução da cobertura jornalística desta efeméride na imprensa portuguesa, ou seja, averiguar de que forma as mulheres, as associações e os temas de género têm sido representados ao longo de mais de três décadas. A análise pormenorizada de 727 notícias do Jornal de Notícias (JN) e Diário de Notícias (DN) demonstra a falta de “substância” no tratamento dos conteúdos, nomeadamente no que diz respeito a temas relacionados com a ascensão profissional e a violência doméstica. 

“As questões estruturais que estão na base das desigualdades experienciadas no mercado do trabalho não são destacadas. Nestas peças, as mulheres assumem relevância noticiosa pe-lo que fazem, mas nunca deixam de ser o que são: mulheres, mães, esposas”, explica Carla Cerqueira, professora do Instituto de Ciências Sociais da UMinho. 
Quanto à violência doméstica, os media aproveitam sobretudo o Dia da Mulher para apresentar dados estatísticos, estudos científicos ou casos pessoais exemplificativos, negligenciando os contextos socio-históricos e as dimensões psicossociais.

O tópico mais enfatizado pelos repórteres é a igualdade, definida como a capacidade para inverter os papéis tradicionais de género. “As mulheres são noticiosamente construídas com características tradicionalmente associadas ao ‘padrão masculino’, isto é, como casos excepcionais”, sublinha a investigadora. A análise mostra ainda que os conteúdos foram frequentemente tratados com perspectivas “muito parecidas”, transmitindo apenas algumas das realidades destas mulheres em detrimento de outras com igual relevância.

A estereotipização jornalística do sexo feminino está associada a questões estruturais, que assentam na desigualdade de género e “precisam urgentemente” de ser desconstruídas. 
“Trata-se de um terreno complexo que exige um trabalho de educação para a inclusão e para a diversidade nos vários campos da sociedade”, reforça a investigadora. Para além de ter analisado mais de sete centenas de artigos, Carla Cerqueira entrevistou duas dezenas de jornalistas, foto-jornalistas e directores, bem como porta-vozes das associações de promoção da igualdade de género, feministas e activistas ligadas ao Dia Internacional da Mulher.
 
Pós-doutoramento 

Carla Cerqueira, 30 anos, é natural de Vila Verde. Doutorada em Ciências da Comunicação pela UMinho, dedica-se aos estudos sobre género e media. Em Janeiro iniciou o pós-doutoramento ‘Olhando por dentro da cidadania e da igualdade de género: as (des)conexões entre a cultura jornalística e as estratégias de comunicação das organizações não governamentais’, trabalho orientado por Rosa Cabecinhas, professora do Instituto de Ciências Sociais da UMinho, Liesbet van Zoonen, da Universidade de Loughbo-rough (Reino Unido), e Juana Gallego Ayala, da Universidade Autónoma de Barcelona (Espanha).

0 comentários: