
Benguela - Angola
A história de Manuel Sousa dava um bom argumento de filme de suspense, drama e alguma ironia. O final ainda está em aberto mas as cenas dos próximos capítulos podem trazer pistas sobre como tudo vai acabar. País das cenas principais: Angola. Actores principais: Manuel Sousa e José Dias, residentes em Vila Verde, secundados por dois empresários angolanos e alguns colegas de profissão.
Maio de 2009. Manuel Sousa estava a fazer umas obras na casa de José Dias, vendedor de automóveis, e já com ideias de criar uma empresa de construção civil em Angola. Contactos estabelecidos surge a Evaristo & Santos e o convite para Manuel Sousa se mudar para a antiga colónia portuguesa. As coisas estavam a correr muito bem, os conhecimentos de Manuel foram crescendo e o trabalho foi sendo reconhecido. José estava agradado com o conterrâneo.
Novembro de 2010. As coisas começam a azedar. José Dias duplica a facturação de uma obra e a marosca é descoberta. O angolano, David Moura, exige a restituição do dinheiro cobrado em falta. Um acordo entre as partes leva a realização de outras obras no valor em falta, cerca de 28 mil dólares (cerca de 19 mil euros). No entanto, José Dias manda suspender a obra, alegadamente por não ter dinheiro para a concluir.
As coisas começam a aquecer. David Moura começa a pressionar Manuel Sousa para a que a obra seja concluída. Este vai transmitindo a José Dias as queixas do angolano. Na casa que os dois e mais três trabalhadores, o ambiente tem a tensão a aumentar. Até que um dia, Moura ameaça com o tribunal e Sousa, em desespero, fala com o sócio angolano da empresa onde trabalha dando-lhe conta do sucedido.
Nesse dia quando chega a casa, José Dias diz: “há aqui alguém que quer atirar esta empresa ao charco”. Manuel Sousa reconhece que não teve a melhor reacção: “insultei-o sim. Digo e não tenho problemas em o assumir”. A resposta foi imediata: “estás despedido”. “Ainda fui trabalhar da parte de tarde como a minha consciência ditou”.
Quando regressou a casa, o patrão angolano estava lá. Reforçou o despedimento e revelou que ia avançar um processo disciplinar. Manuel Sousa pediu que lhe pagassem o que lhe deviam. Desde 29 de Novembro, Manuel Sousa não teve mais trabalho nenhum, “ia lá comer e eles olhavam-me de canto”.
Dia 24 de Março de 2011. José Dias dá três dias a Manuel Sousa para sair de casa. No entanto, nesse mesmo dia desfaz a cama do trabalhador que se vê obrigado a chamar a polícia que exige que a cama volte a ser montada. No dia seguinte, a mesma cena. Para não se chatear mais, Manuel Sousa, socorre-se de David Moura, de que se tornara amigo. É ele que lhe dá guarida.
7 de Abril de 2011. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras pede-lhe para se deslocar lá por causa do visto de trabalho. A partir daqui surgem os três dias mais negros da vida de Manuel. “Sentei-me e avisaram-me logo que dali já não saia mais e ia ser mandado para Portugal. Não me deixaram ir a casa buscar seja o que for e a roupa que trouxe foi pedida a alguém que ma fosse buscar. Vim sem meias e só com uma camisola, umas calças e uns sapatos. Esteve um dia inteiro sem comer e para o conseguir é outro filme dentro do filme.
O caso chega ao conhecimento do vereador do PP na câmara de Vila Verde que consegue através do cônsul em Benguela saber mais pormenores sobre o caso. Daniel Cerqueira envolveu-se, pessoalmente, no caso, depois da mulher de Manuel Sousa ter ido pedir ajuda porque o dinheiro não chega. Foi aqui que o vereador popular sabe dos pormenores da história e esta começa a ganhar amplitude.
A história pode ter um final feliz: “quando tudo se resolver e se conseguir o cartão de residente levo a família para lá. Não me arrependo de ter ido. Ando lá como ando cá”. Para já quer reaver os 43 mil dólares (aproximadamente 30 mil euros) mais o resto do contrato que tem até Setembro e que ainda está válido. Nos próximos dias vai regressar a Luanda para resolver as questões na justiça. Na bagagem leva 22 testemunhas para o abonarem no processo de despedimento. José Dias apresenta apenas duas.
Pormenores.
Benguela: Manuel Sousa estava a trabalhar em Benguela e foi escoltado até Luanda por polícias armados para ser recambiado para Portugal. No aeroporto, depois de 24 horas sem comer e já em desespero e após vários pedidos, alguém vai com ele ao bar. “Eu tenho dinheiro para comer” bastou para que as coisas se desbloqueassem.
David Moura: empresta-lhe seis mil dólares, “que ainda não estão pagos”, para sobreviver nos meses em que esteve sem trabalhar e sem receber. Foi na casa do angolano que comeu algumas vezes e onde arranjou algumas roupas: “o José Dias mandou os outros trabalhadores deitarem a minha roupa fora. Quando lá cheguei não havia quase nada”.
Passaporte: Desde Novembro até ao dia em que entrou no avião para vir embora ninguém lhe pôs a vista em cima. A empresa pagou-lhe o bilhete de regresso mas ainda lhe deve vários salários estando o caso a ser resolvido em tribunal.
Despedimento: Um dos dados mais incríveis de tudo isto prende-se com o despedimento e o processo disciplinar. Não há papéis assinados nem pela empresa nem pelo trabalhador. Portanto, oficialmente não houve despedimento. O mais curioso é que o passaporte quando aparece tem um visto de trabalho válido desde Janeiro de 2011 e por um período de um ano.
Salários: 2500 euros era o valor apalavrado pelas partes como salário. No entanto, os recibos apareciam com metade desta verba. O salário apalavrado sempre foi cumprido até Novembro do ano passado. “Deviam cinco meses e quando me vim embora queriam pagar três a 1200 euros. Não assinei os recibos, como é óbvio”.
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