Aboim da Nóbrega: Descoberto 'Dente Santo'


O paradeiro do ‘dente santo’ era desconhecido das gentes de Aboim desde 1920, quando o então proprietário – Manuel António Martins – foi detido e acusado de burla, numa altura em que procedia às rezas e tratamentos que preveniriam os males provocados por animais com raiva na zona de Vila Nova de Gaia e Espinho.

A relíquia acabou por ser apreendida, sem que o dono – que residia em Aboim, tal como os seus antepassados, de quem herdou o ‘dente santo’ – tivesse tomado conhecimento do destino da peça única, cuja origem nunca foi cientificamente certificada, apesar das crenças populares.

Já sabia da existência do ‘dente santo’ pelo relato da população mais idosa, e quis que os escuteiros fossem à sua descoberta”, conta Fernando Pereira, chefe do agrupamento escutista e apaixonado pelas tradições locais. Foi ele quem, após um ano de pesquisas, conseguiu reencontrar a relíquia numa ala do Hospital de S. João, no Porto.

Depois de apurados os relatos dos moradores mais idosos, Fernando Pereira deslocou-se a Lisboa, onde passou pela Biblioteca Nacional, Instituto Abel Salazar, Instituto de Medicina Legal e Instituto de Anatomia. Pouco ou nada encontrou, mas acabou por ser o suficiente para descobrir uma pista que o levou ao Museu de História da Medicina da Faculdade de Medicina do Porto, instalado numa ala reservada do Hospital de S. João.

Em Junho pude, finalmente, observá-lo”, relata Fernando Pereira, revelando que o ‘dente santo’ se mantém “num relativo bom estado de conservação” e “está colocado entre um conjunto de outros objectos e relíquias da medicina popular”.

Com a colaboração dos elementos do Agrupamento de Escuteiros de Aboim, procedeu ao registo fotográfico do achado e promoveu uma exposição intitulada ‘Os Escuteiros de Aboim da Nóbrega na Rota do Património’, reservando um lugar especial à medicina popular e religiosa, onde se insere o famoso dente que é atribuído a S. Frutuoso – que foi arcebispo de Braga e cujo mausoléu, de construção visigótica, se encontra situado em Real.

Na exposição de Aboim, entre os diversos registos fotográficos e informativos sobre o património local, destacavam-se ainda o ‘corno da peçonha’, ‘D. João de Aboim’ e os tradicionais lenços dos namorados. Mas o ‘dente santo’ foi a ‘estrela’.

NAS FEIRAS E FESTAS DO MINHO

No início do século XX, “a fama do ‘dente santo’ era enorme”. Fernando Pereira sublinha que a relíquia marcava presença em todas as feiras e festas populares do Minho, além de ser chamado a curar mordeduras de cães raivosos em toda a região. Conforme relatam ainda hoje os mais idosos residentes em Aboim, a família do ‘dente santo’ – os Martins – era “remediada e até dispunha de alguma capacidade financeira”, graças aos pagamentos devidos pelas suas deslocações e curas com o dente.

O escutista Fernando Pereira garante mesmo que a família, caso o ‘dente santo’ se tivesse mantido na sua posse, “ainda hoje manteria a tradição”. “Em 1920, os jornais referiram-se largamente a um curandeiro que foi preso em Vila Nova de Gaia, por andar tratando indivíduos mordidos por cães raivosos”, conta J. A. Pires de Lima, professor da Faculdade de Medicina do Porto, a quem foi confiada a relíquia, depois de ter sido apreendida e retirada a Manuel Martins, que na altura tinha 54 anos.

O ‘coitado’ do Martins regressou a Aboim sem o dente. Contou que lho haviam roubado. Segundo os relatos da época, os vizinhos ficaram desolados por terem perdido um dos objectos de maior crendice popular. Fonte Correio da Manhã

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