Vila Verde: História de uma criança agressiva


No último dia do ano resolveu vir a Braga de autocarro. Depois, sem dinheiro para o regresso, assaltou dois estudantes com uma navalha. Marcado por comportamentos agressivos, na escola não admitia que "pegassem" com ele. Desta vez aprendeu a lição.

A escola, como lhe recordou a juíza presidente, tem regras para se cumprirem. Mas ele não estava para isso. Com os nervos à flor da pele, se alguém o provocasse não ficava sem resposta. Depois, chegou frequentou um curso de formação profissional, mas foi expulso por comportamentos agressivos. Desde os bancos da escola que é acompanhado por psicólogos. "Estou arrependido do que fiz", disse ele à juíza presidente, em resposta à acusação do Ministério Público. Se lhe derem trabalho garante que não faz nada desse tipo de coisas. De assaltos.
José F., de 17 anos de idade, solteiro, estudante, vem do concelho de Vila Verde. A 31 de Dezembro último, por volta das 12,30 horas, junto ao coreto da Avenida Central, abordou pelas costas o jovem A. Filipe, tocando-lhe no ombro.

A acusação do Ministério Público, lida pela presidente do colectivo que estes dias o julgou o na Vara Mista do Tribunal Judicial, refere que, quando A. Filipe se voltou, o vilaverdense puxou pela camisola e, exibindo uma navalha, exigiu que Filipe lhe entregasse o dinheiro que tinha e o telemóvel.

Filipe não tinha dinheiro mas, com medo, entregou-lhe o seu telemóvel azul, avaliado em 50 euros. O assaltante pôs-se então em fuga, dirigindo-se para a Central de Camionagem.
Prosseguindo a leitura, a presidente do colectivo, juíza Prazeres Silva, referiu que nesse mesmo dia, cerca das 12,45 horas, no interior da Central de Camionagem, na Avenida General Norton de Matos, o arguido sentou-se no mesmo banco em que se encontrava D. Nuno, repetindo a operação anterior. Ou seja, exibiu ao ofendido uma navalha com 6 centímetros de lâmina e encostou-a ao pulso da mão esquerda, provocando-lhe uma ferida punctiforme (com o aspecto de um ponto), de pequenas dimensões na face interna dessa parte do corpo.

O ofendido Nuno viu-se, pois, obrigado a entregar-lhe o seu telemóvel de 55 euros, pondo-se o arguido em fuga.
Contactada a PSP, o arguido foi detido ainda na Avenida General Norte de Matos. Na sua posse tinha 10 euros e dois telemóveis, um dos quais era o do ofendido A. Filipe, e a navalha. O outro telemóvel — o do D. Nuno já tinha sido vendido por 10 euros a um indivíduo cuja identidade não foi possível apurar.
A acusação aponta ainda o facto de D. Nuno, com a actuação do arguido, ter sofrido lesões que lhe causaram directa e necessariamente 5 dias de tratamento, sem afectar a sua capacidade de trabalho profissional.
Com a sua actuação, segundo o Ministério Público, o vilaverdense pretendeu, por aquele processo, apropriar-se dos telemóveis para si, “bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que actuava sem o consentimento e contra a vontade dos seus legítimos donos".

Por isso o jovem assaltante foi acusado pelo Ministério Público da autoria de dois crimes de roubo. O Código Penal diz que "quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos".

Neste julgamento, o Ministério Público fez-se representar pelo procurador da República Manuel Queirós, sendo a defesa oficiosa do arguido confiada ao advogado Augusto Braga.
Pronunciando-se sobre a acusação, o jovem acusado iniciou a sua intervenção com um pedido de desculpas, sublinhando ser verdade o que a juíza presidente lhe acabara de ler.
"Estava na fase má" — disse ele, recordando-se do que tinha feito. Foi numa manhã de sábado. Chegara a Braga de autocarro, vindo de Vila Verde e depois constatou que não tinha dinheiro para a viagem de regresso. Nas vezes em viveu uma situação dessas resolveu-a, voltando para a casa a pé. Andava sempre com a navalha.

Desta vez recorreu a um outro processo, condenável embora. "Só fiz asssim com a navalha" — disse ele ao colectivo de juízes, exemplificando o gesto ligeiro que fez, numa perspectiva de lhe retirar uma violência maior da imagem.
"Mas picou-o!…" — observou-lhe a juíza Prazeres Silva, remetendo-se o arguido ao silêncio.
O vilaverdense puxou então da memória e falou da sua vida da frente para trás. Já frequentou um curso de formação profissional em hotelaria, com duração de dois anos. Foi expulso por comportamentos agressivos.

Psicólogos — esses profissionais que estudam comportamentos mentais do homem — teve-os ele desde os bancos da escola. Encarregam-se, certamente, lhe fazer o diagnóstico sobre os seus problemas emocionais ou perturbações de personalidade.
A mãe é doméstica e o padrasto é trolha. Os dois irmãos são mais novos que ele, José F.
Preso preventivamente, ficou em casa sob o controlo da pulseira electrónica, mas ele mandou às urtigas esta medida de coacção. E disse que só saiu de casa uma vez.
"Só lhe acontecem desgraças" — disse-lhe, suavemente, a juíza presidente.
José F. continuou com a s suas recordações de infância.

Na escola os professores "pegavam" com ele e ele reagia. Os seus colegas mandavam-lhe "bocas". Quando disse que foi a primeira vez que fez asneiras ficamos sem saber se se referia à matéria da acusação do Ministério Público ou se, na escola, seguramente respondendo às provocações, desatava ao estalo e ao pontapé aos colegas ou se foi mais longe. Até porque o número de de agressões a professores tem vindo a aumentar no país, segundo queixas dos sindicatos ligados à Educação.
Os jovens ofendidos narraram os respectivos episódios vividos com o arguido, confirmando o que anteriormente se disse.
"Nunca chegou a haver contacto físico porque me distanciei", contou A. Filipe, de 20 anos, confirmando a restituição do seu telemóvel de 50 euros.

O Nuno, de 18 anos, revelou que o arguido lhe pediu o empréstimo do telemóvel e por recusar é que lhe encostou a navalha, picando-o na mão esquerda.
O advogado de defesa do arguido chamou sobretudo a atenção para o caso de José F. e as razões do seu comportamento. O facto dele ter confessado os factos de que vinha acusado deve, igualmente, ser tido em conta.
"Estou arrependido do que fiz" — disse José com humildade. Se lhe derem trabalho na faz nada disso. Além disso — acrescentou ainda — já aprendeu a lição. A juíza presidente recordou-lhe que as escolas têm regras. Só que o arguido é que, pelo que ele contou, não estava disposto a cumpri-las.Fonte Correio do Minho por Luís M. Fernandes

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