Vila Verde: Lenços são preciosas ajudas para declarações de amor (Via Jornal A União)


Mensagens de amor e saudade, bordadas no "Lenço dos Namorados” de Vila Verde retratam “tempos” de uma história que já passou.

Maria Alzira conta 83 anos, mas já não sabe contar quantos lenços bordou. Mas foram “mais do que os amores que tive”, graceja. No “tempo dela” cada moça bordava o seu lenço e, depois, enviava-o ao rapaz pelo qual se havia “enamorado”.

Se o sentimento fosse correspondido, o rapaz “usava o lenço no chapéu ou na lapela. Senão, devolvia-o. E a moça chorava dias a fio”, conta, enquanto encena com as mãos o “choro” das “moças despeitadas, as coitadas”.

Hoje já não é nada disso. “Agora as meninas compram os lenços. E meninos também. As moças de hoje nem um botão sabem coser”, lamenta, mais com ternura do que com desdém.

“Zirinha dos bordados”, como lhe chamam as vizinhas, borda lenços para as “solteironas de hoje” há “mais de três décadas”. Depois de um silêncio diz: “Pensando bem, já há muito ano que as moças não pegam na agulha”.

“Tanto melhor para mim”, conclui, pousando o lenço no qual borda a palavra “saudade”, onde ainda faltam três letras.

Diz ser das poucas bordadeiras que trabalham sozinhas. “Até podia aderir àquela coisa da Aliança Artesanal, mas assim bordo como quero”, explica enquanto volta a meter o dedal e recomeça a bordar.

Bordou muitos lenços de “amor, esperança, coisas bonitas”, mas também bordou tempos difíceis da “história de Portugal”, num tempo em que os “anos da emigração foram tristes”-

“Quando o namoro ia para fora, a moça mandava-lhe um lenço com os dizeres do passarinho. Eu chorava a cada lenço que bordava. Principalmente quando iam para o Brasil”, explica.

“Bai carta feliz buando nas asas dum passarinho cando bires o meu amor dále um abraço e um veijinho”, canta, novamente com a agulha pousada e o olhar “naqueles tempos”.

Maria Alzira vive da reforma, “trezentos e oitenta euros” e são os “lencinhos” que lhe dão mais “alguns contos por mês”.

“Tudo depende dos pedidos”, explica, “mas também já não tenho as mãos que tinha. Demoro o dobro do tempo agora, mas continuam perfeitinhos. Não é por minha causa que a moça não arranja namoro”, diz, matreira, enquanto volta a dançar com a agulha no pano.

Feitas as contas, “ganho uns quatrocentos euros por mês com os lenços”. Mas tempos houve em que só com os lenços “pagava as contas e dava alguns aos meus filhos”.

Maria Alzira, bordadeira, borda “as palavras que a vergonha não deixa dizer”, apesar de as moças de hoje “dizerem tudo”.

Enquanto as “mãos deixarem”, ‘Zirinha’ bordará à “moda de Vila Verde, que o resto é imitação”.


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